editorial

BRASIL 500 ANOS

 
  Os 500 anos da historia do Brasil foram marcados pela destruição. No campo ambiental a área desmatada dos três maiores biomas - Amazônia, Floresta Atlântica e Cerrado - soma, no total, 2,7 milhões de km2, ou seja 31,7% do território nacional e 62 vezes a superfície do Estado do Rio. Imagine a bandeira brasileira sem um terço de seu verde :

A principal vítima foi a Mata Atlântica. Do período colonial até hoje, perdeu 93% de suas florestas que originalmente cobriam 1,3 milhões de km2 ao longo do litoral. Em áreas como as florestas de araucária no Sul do país, há apenas 2% da cobertura original. O Cerrado perdeu 50% ou 1 milhão de km2, de sua cobertura original, desde o início de sua ocupação na década de 50. Já a Amazônia, nos últimos 25 anos, teve destruídos cerca de 15% da floresta ou 551 000 km2. Com as matas foram embora também os animais que nela habitavam. A árvore que foi o símbolo do país e que lhe deu o nome, o Pau Brasil, é uma espécie em via de extinção e quinhentos anos depois só é encontrada em jardins botânicos.

A agricultura é um dos principais responsáveis pelo desmatamento. O problema é a forma que se exerce a agricultura. Os três mitos da época da colonização ainda persistem. São eles : "Nessa terra em se plantando tudo dá", a natureza é inesgotável, e não é preciso adaptar tecnologia à natureza.

Os ciclos econômicos do Brasil Colônia são exemplos da exploração predatória dos recursos naturais. Grandes extensões de Mata Atlântica foram destruídas para abrir espaço para os canaviais. Calcula-se que para cada quilo de açúcar produzido no Brasil queimou-se cerca de 15 quilos de lenha.

A atividade econômica do século 18 foi dominada pela mineração do ouro e dos diamantes, de forma também predatória. Encostas foram desmatadas, rios foram dragados e seus cursos desviados. Pelo menos 100 toneladas de mercúrio foram utilizadas na extração do ouro em Minas Gerais.

No século 19, o ciclo do café, também destruiu o meio ambiente. O plantio, originalmente feito em áreas de sombra, foi feito no Brasil em áreas desmatadas da Mata Atlântica. Para cada hectare que se pretendia abrir para a lavoura, de cinco a 10 eram destruídos pelo fogo descontrolado.

Já no século 20, começaram a ser destruídos o Cerrado e a Amazônia. O Cerrado, como aconteceu com a Mata Atlântica, está sendo visto como um embaraço que deve ser superado. A expansão da fronteira agrícola, destinada à produção de grãos para a exportação, vem dizimando este bioma.

Dos anos 50 para cá o mercúrio continua sendo usado nos garimpos, a fronteira agrícola continua em expansão, existem 30 mil focos de queimadas por mês no país durante a época da seca e os desmatamentos nas encostas ainda provocam erosão e enchentes.

A destruição veio, as lições não foram aprendidas e chegamos ao século 20 com moto-serras e tratores e ainda acreditando nos três mitos. Os mitos continuam, só que com mais tecnologia.

Mas o ser vivo que mais sofreu no Brasil foi o índio. Dos 3,5 milhões que existiam nessas terras resta apenas o equivalente à metade da população de um bairro como Copacabana. Os Pataxós que viram Cabral chegar com suas caravelas em Porto Seguro há quinhentos anos, até hoje apanham da polícia do homem branco e riscam de serem queimados vivos quando protestam por suas terras.

Mas a destruição não é só ambiental ou étnica. Nos 500 anos de história do Brasil os brasileiros destruiram uma grande parte de sua própria história. A ignorância e o descaso demoliram pouco a pouco a memória de um povo. E quando se destrói a memória é impossível de calcular as cifras desta destruição. Quantos porcentos de casas, fazendas, igrejas, capelas, mosteiros, palácios, fortalezas, estações de trem, teatros ou escolas foram transformados em pó nestes últimos 500 anos ? O mito do "Brasil país do futuro" levou o povo a "destruir para construir" cavando assim o túmulo do seu patrimônio.

Essas coisas interessam pouco o sumidourense pois a Amazônia fica longe, o Cerrado êle nunca viu e a Mata Atlântica desapareceu muito antes do seu nascimento. Quando êle contempla os morros pelados que cercam a sua cidade êle nem imaginaa que 42% das espécies de aves que existiam ali desapareceram desde a construção do primeiro povoado. Aliás deste primeiro povoado resta pouca coisa também. Quanto aos índios que viviam por ali só sobrou o mito de Peri.

Mas o sumidourense como todo bom brasileiro tem um rico vocabulário para exprimir sua opinião sobre o assunto : "pois é", "não tem jeito não", "tá cada vez pior", "o povo aqui é assim mesmo", "a culpa é do governo", "deixa pra lá", "não adianta", são algumas das expressões mais ouvidas. O resultado dessa mentalidade foi a destruição. Não devemos simplesmente lamentar a destruição, mas aprender com o passado e fazer diferente, adotando medidas preventivas e salvando o que ainda pode ser salvo. Falta apenas uma expressão no vasto dicionário do brasileiro : "Faça algo". Um povo que não se interessa ao passado é um povo que não tem futuro.

Parabéns para o Brasil nesta data querida, muitas felicidades e muitos anos de vida !